Decorreu no passado dia 15 de setembro de 2023, no Centro Ismaili, em Lisboa, a realização da conferência “Animar: 30 anos de História, 30 anos de Futuro”.

Associada às celebrações da segunda edição do Dia do Desenvolvimento Local e do seu 30º aniversário, esta conferência confluiu num momento de reflexão sobre o papel das entidades de desenvolvimento local, pela experiência e características que apresentam, na promoção da inovação social e apoio à implementação de políticas públicas promotoras do desenvolvimento integrado e da coesão social e territorial.

Na sessão de boas vindas, Yasmin Bhudarally, Presidente do Conselho Nacional da Comunidade Ismailli Portugal e Espanha, destacou o papel do espaço que acolheu esta iniciativa para promover o encontro entre pessoas, entre fés e culturas distintas, para promoção do pluralismo e para o serviço em prol do desenvolvimento das comunidades e da sociedade em geral. Por fim, reforçou ainda que os valores da democracia, igualdade e justiça social, debatidos neste encontro, são temas muito caros para toda comunidade Ismaili.

Ana Mendes Godinho, Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, na sessão de abertura, destacou os recentes dados da Conta Satélite de Economia Social, que denotam que a economia social não é uma utopia, pois são cerca de 300 000 as pessoas que trabalham ao serviço das pessoas.

A Animar é uma conquista de pessoas e dos valores naturais do ser humano, que representa uma Rede de Desenvolvimento Local de uma economia social resiliente, que tem capacidade de criar emprego, nomeadamente no Interior, e permite que o desenvolvimento aconteça”, referiu Ana Mendes Godinho, concluindo que a Animar é vanguardista na concretização dos ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, sendo uma entidade com história, mas futurista do desenvolvimento social.

Destacando a relevância da intervenção da Animar para o combate às desigualdade e enquanto agente de inclusão, a Ministra frisou que a economia social em muito tem contribuído para trazer as mulheres para o espaço público, mas é necessário promovermos um maior envolvimento das mulheres nos cargos de direção das entidades de economia social.

São inúmeros os desafios futuros que se colocam ao setor, sobretudo no que respeita ao financiamento e à capacitação, ao nível da gestão, quer ao nível das equipas, pelo que é preciso criar sementes para a próxima geração de líderes socais, de modo a fixarmos talento e acelerarmos a valorização do impacto deste setor, que continua a ter a capacidade de inovar. A criação de um Pacto Social para o Desenvolvimento é o pilar essencial de uma conquista da democracia e de construção de uma paz transformadora, acrescentou.

Marco Domingues, Presidente da Direção da Animar, começou por destacar a coincidência da celebração do Dia do Desenvolvimento Local com o Dia Internacional da Democracia, e fez uma breve resenha histórica da Animar que começou por ser um sonho de um grupo de dez pessoas, no Encontro do Mezio, em Castro Daire, em 1992.

Nascida formalmente a 17 de setembro de 1993, enquanto organização da sociedade civil, a Animar juntou a vasta experiência destas pessoas, destes dinamizadores e líderes que com o apoio de políticas publicas, respondiam a problemas sociais, dos quais se destacam as ILE – Iniciativas Locais de Emprego, lançadas pelo Dr. Acácio Catarino, em 1979, enquanto Secretário de Estado da População e do Emprego no quadro do Ministério do Trabalho e da Segurança Social ou na década de 90 a Iniciativa comunitária LEADER.

Segundo o Presidente da Animar, falar do desenvolvimento local, é naturalmente reconhecer a importância do papel das autarquias, da sua dimensão estrutural que facilita e impulsiona o trabalho das entidades sociais, enquadradas na Lei de bases da Economia Social, onde, e muito bem a Animar se integra e as representa. No entanto, são as entidades sociais, que por um lado complementam o trabalho do Estado central ou local, e por outro, o substituem pela incapacidade e ausência de resposta aos problemas sociais e também ambientais. O percurso da Animar uma organização Rede de Redes, é ímpar, marcado pela nossa presença em 172 Concelhos.

Marco Domingues reforçou que “estamos associados à Animar enquanto entidades, mas também enquanto pessoas, reconhecemos o papel fundamental da ação coletiva para procurar a mudança através do papel que a sociedade civil representa. Somos agentes solidários de desenvolvimento sustentável, justo e equitativo, porque reforçamos a democracia participativa no contributo para a coesão social e territorial, para a justiça social e igualdade.”

Acreditamos que com a experiência que temos de intervenção comunitária, podemos realmente contribuir para mudanças efetivas, na luta contra a pobreza, na promoção da igualdade, na formação e capacitação das pessoas, no combate às alterações climáticas, na educação para a cidadania, enfim, na promoção do bem-estar das pessoas e dos ecossistemas naturais que as sustentam. É importante que o Estado reforce e crie condições para as entidades de intervenção comunitária para o Desenvolvimento Local, frisou o Presidente da Animar.

“Concretizada através de dirigentes associativos que investem o seu tempo, competências e recursos no bem comum local, estes, necessitam de um maior reconhecimento e proteção do Estado”, acrescentou.

O Presidente da Animar apresentou um conjunto de propostas e recomendações para o Desenvolvimento Local que poderão ser consultadas AQUI.

José Manuel Henriques, investigador do Dinâmia-CET, abordou os desafios económicos e sociais para o Desenvolvimento Local, tendo realizado um “retrofuturismo” do movimento de Desenvolvimento Local, com referência à Iniciativa Comunitária EQUAL, reforçando que é preciso pensar na figura dos contratos atípicos da Segurança Social para contribuir para a sustentabilidade da animação territorial.

Abordando o Tratado de Lisboa “Coesão Territorial” e Relatório Barca (desenvolvimento Place-Based), o investigador falou sobre a atualidade do Desenvolvimento Local de Base Comunitária, a descentralização de transferência de competências e atribuições e competências, enquanto paradoxo da proximidade, integração de políticas e novas formas de governança.

Depois de uma resenha histórica dos anos 70, 80, 90 e da década de 2000, no âmbito das quais foi fazendo algumas reflexões, Jose Manuel Henriques destacou a importância de se repensar a iniciativa local, agency e novas formas de governança com integração territorial de políticas (multinível, intersetorial) face à imprevisibilidade “cisnes negros”, destacando o exemplo da pandemia, da Guerra da Ucrânia e dos desafios emergentes na nossa sociedade, nomeadamente no campo das alterações climáticas, da saúde, do envelhecimento da nossa população e da situação de pobreza (superação do paradoxo português, contexto e interdependências; pessoas em situação de pobreza e empobrecimento, etc.).

No âmbito da mesa redonda, moderada por Fernanda Freitas, foi referido que a igualdade não é possível sem diversidade e pluralidade, sendo esta considerada um pilar para o Desenvolvimento Local, destacou Dália Costa, cocoordenadora e cofundadora do CIEG (Centro Interdisciplinar de Estudos de Género) e Investigadora no CAPP (Centro de Administração e Políticas Publicas) – ambos Centros de Investigação do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP-ULisboa).

A Diversidade enquanto valor (Responsabilidade Cidadã), sermos cidadãos e cidadãs com responsabilidade pelo outro para realizar a igualdade, tem de ser capitalizado (capital social). Temos uma economia que gera valor em termos de economia social e solidária que não é reconhecida e tem um potencial enorme para apoiar e orientar as políticas públicas, frisou Dália Costa.

Rogério Roque Amaro, um dos fundadores da Animar, investigador e economista do ISCTE, recentemente reconhecido como o cérebro da nova universidade popular e comunitária de Lisboa, a Pluriversidade, diz acreditar mais nas comunidades do que nas instituições, dando como exemplo o trabalho que tem vindo a desenvolver no âmbito dos grupos comunitários, destaca a necessidade de haver um maior cruzamento da vida com Economia Solidária, Desenvolvimento Local.

Para o investigar, existem novas formas de pobreza e exclusão social, sobretudo ao nível da língua e educação decorrente do aumento de imigrantes com filhos/as pequenos e pequenas. Destacou que estão a surgir novos desafios na sociedade para os quais temos que estar atendemos, nomeadamente ao nível da saúde mental – perturbações e doenças mentais, que se vão acentuar com o aumento do desemprego e emprego precário, bem como os novos empregos ligados a imigrantes. Por outro lado reforçou também o problema de habitação, que requer o regresso do papel da comunidade, sendo que o maior desafio é o conseguirmos ser do que se faz na proximidade, frisou.

José Carlos Mota, Professor Auxiliar do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e Territoriais da Universidade de Aveiro e investigador do GOVCOPP, fez referência ao trabalho de proximidade que tem vindo a ser realizado em alguns bairros sociais, destacando que há uma perda de sentimento comum, que traz consigo a angústia pela incerteza do futuro. Precisamos de saber com quem vamos enfrentar estes desafios, e isso implica a mudança dos estilos de vida, referiu.

“Como é que nós, sociedade civil e organizada, conseguimos fazer a diferença? Há um mito rural e urbano que os cidadãos não se interessam pela participação. Os 50 anos da democracia, os 20 anos de orçamento participativo, os 10 anos de bip zip, os 30 anos de aniversário da Animar mostram o contrário. Quando acreditamos na causa, nós associamo-nos!”, acrescentou.

As pessoas aparecem, envolvem-se e têm capital de energia cívica e solidária. Ensinar fazendo e aprendendo fazendo. Não há um problema genético que nos tenha debilitado para a ação cívica, mas é preciso mudar os métodos para facilitar a participação, destacou o investigador.

É preciso criar medidas e programas de fomento da democracia participativa e da cidadania para o Desenvolvimento Local de modo a promover a participação e a diversidade.

Nós continuamos a ter uma visão um pouco setorial da questão: participação, governança, ambiente, social, e as alterações climáticas estão com uma força maior do que os cientistas pensavam, destacou Francisco Ferreira, presidente da ZERO.

Esta semana começa uma mobilização em todo o mundo. Ao nível local (Lei do Clima), cada município deve ter um Plano Local de Ação Climática, que deverá ser construído de uma forma participada e que não pode ser uma mudança de paradigma só do município, mas sim das pessoas do município para identificar as respostas a serem encontradas.

O Presidente da Zero reforçou a proposta de criação de uma Estratégia Nacional para o Bem Estar, que nos permitiria tornarmo-nos mais resilientes a um conjunto de crises, dando como exemplo as comunidades de energia, que estão previstas na legislação, mas não nos organizamos para trabalhar numa lógica comunitária.

Marcelo Rebelo de Sousa, não podendo estar presente em virtude da sua presença junto das comunidades portuguesas no Canadá, associou-se à iniciativa e enviou uma mensagem, na qual destaca que falar de desenvolvimento local é falar de coesão social e territorial. Para o Presidente, este é um dos problemas que está por resolver no nosso país, uma vez que muito se tem feito, mas muito há por fazer para inverter a consistente faixa de pobreza e as desigualdades e assimetrias entre territórios.

É preciso criar foco, aprender com o passo, analisar o presente e projetar o futuro, com o envolvimento das comunidades, com um modelo de desenvolvimento local que parta da base para o topo para que possamos contribuir para a construção conjunta de um futuro melhor em matéria de desafios económicos, sociais e ambientais, de desenvolvimento sustentável”, frisou Marcelo Rebelo de Sousa.

No encontro, foi também apresentada a agenda de comemorações dos 30 anos da Animar, que decorrerão até 17 de setembro de 2024, e visa um conjunto de iniciativas a serem realizadas pela Animar, bem como pelas suas associadas, desde a apresentação de livros, seminários, tertúlias, sendo esta uma agenda em construção nos vários territórios onde a Animar marca presença.

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